17 abril 2008

Por que a música Porto Alegre de Adriana Calcanhoto se chama Porto Alegre?

Caifer perguntou: Achei engraçado que a música Porto Alegre do cd Maré de Adriana Calcanhoto se chame Porto Alegre, você saber o porque desse título?

Prezado professor Caifer, eu penso que adriana possui uma poética calcada na expressão discreta de sua orientação sexual. Digo discreta porque tudo em Adriana possui essa aura cool urbana que recobre seu trabalho. Mas, pode reparar, quando pode, Calcanhoto sempre lembra, low profile, de seus desejos e amores.
Posto isso, acredito que Porto Alegre retrata essa trajetória de vida da artista, sua descoberta enquanto garota gay que, num momento inicial talvez pré-adolescente, resistiu o quanto pode aos encantos das sereias, mesmo que para isso, precisasse se manter amarrada (e com as orelhas tapadas) ao mastro do navio (alusão simbólica ao falo e à figura masculina, ou seja, manter seus desejos atrelados ao pênis).
Mas, como a propria música nos diz, depois de um tempo navegando ao sabor das ondas (mar = inconsciente) quando ela chegou à terra firme, nao resistiu mais aos encantos das sereias, o encanto de Calipso (a ninfa grega das águas, mestre da sedução que quase traçou até o Hercules), não resistiu mais à atração que a figura feminina impunha a sua psiquê. E daí nunca mais saiu dessa. Quem ou o que, promoveu essa firmação de sua orientação? Lógico que foi a chegada à terra firme, a volta ao porto (terra = pé no chão = consciente). E, ainda mais especificamente, no caso de Adriana, seu entrosamento no contexto avant guard da metropolis sulista Porto Alegre (Gay Harbour).

22 fevereiro 2007

Sobre modelos de óculos escuros usados em enterros de figurões

Goiaba perguntou:

Tenho observado, até por uma razão de ofício, alguns enterros de figurões, geralmente de conduta suspeita quando vivos. Nestas ocasiões ninguém relativamente colunável quer perder a boca. Minha pergunta é: O que os modelos de óculos escuros usados nestas ocasiões ligam o usuário (dos óculos) ao defunto?


Prezado Goiaba, de uma maneira clara e simbólica, os grandes espaços formados pelas lentes escurecidas dos óculos remetem a uma abertura e amplificação do olhar do usuário vivo. É como se exacerbássemos a capacidade dos olhos de serem a janela da alma, escancarando-os e protegendo-os ao mesmo tempo. Por um lado, a lente imensa amplia a capacidade de passagem de informações, o fluxo de sentimentos entre o interno e o externo. Entre o dentro de nós e o fora de nós, entre o corpo e a alma, a noite e o dia, o morto e o vivo. Por outro lado, a tonalidade das lentes, faz com que esse transmutar de energias seja feito de maneira plena e suave.

Acredito que o modelo de óculos amplos e parabólicos, comumente usados pelos colunáveis, em enterros de defuntos suspeitos, retratam essa característica de passagem e sinergia entre o mundo espiritual e material que, nos colunáveis (e nos defuntos suspeitos) está bastante desequilibrado. Além de também simbolizar a relativa ambivalência do estar e querer aparecer das celebridades e, ao mesmo tempo, não querer ser associadas aos aspectos negativos da vida vivida pelo famigerado defunto. Para maiores informações, recomendo a leitura do delicioso livro do sociólogo pós-moderno Paul Amorim Rossetti, chamado “Do you wanna a frame for your soul's window? (Pergamon Press, 1987) em que ele discute, a partir de situações cotidianas, a capacidade do homem de ampliar os significados e significantes (e resignificá-los a todo instante conforme sua rede particular de significações) transformando situações ancestrais (como enterros) em brand new experiences do olhar.

O que é a Farra do Goy?

Eduardo Martins perguntou:
Afinal, em que consiste a tradicional festa do calendário judaico, praticada principalmente entre os judeus de Santa Catarina, conhecida como "A Farra do Goy"?

Prezado Eduardo, a princípio, o significado da palavra goy em hebraico, e encontrado no Torá, se refere à nação-povo judeu: "’Mas sereis para Mim um reino de sacerdotes e uma nação sagrada.’ Estas são as palavras que falarás para os Filhos de Israel." Shemot 19:6.
Nesse texto, a palavra goy é usada para designar os filhos de Israel. Porém, atualmente, esse mesmo termo é bastante usado pelos judeus para caracterizar os não-judeus, os assim também chamados gentios.
Com a destruição de Jerusalém no ano 70 D.C. os judeus se dispersaram pelo mundo (episódio conhecido como a Grande Diáspora). Muitos deles foram parar na Península Ibérica. Com o crescimento do cristianismo, o povo hebreu começou a ser perseguido. Em Portugal, eles tiveram uma relativa folga com a invasão dos mouros que aceitavam todas as religiões que seguissem um livro sagrado, desde que pagassem uma espécie de dízimo para eles (os mouros). Mas isso não durou muito tempo, quando os cristãos começaram a ferver de novo, os judeus se ferraram, ou se convertiam em cristãos novos ou... já era! Daí que surgiu aquele monte de novos sobrenomes todos derivados de árvores: figueira, nogueira e etc. Eram os judeus convertidos em Portugal que, mesmo assim, podiam ser identificados pelo sobrenome novo de árvores que agora possuíam.
Como todo mundo sabe, uma boa parcela deles veio parar no novo mundo, na terra brasilis. Mas, o que pouca gente sabe, é que uma parcela da população judia lusitana, recusou-se a converter-se ao cristianismo e também veio para o Brasil, só que clandestinamente. Grande parte deles se estabeleceu no sul do país, em meados do século XVII, principalmente em Santa Catarina, o que, séculos mais tarde, ironicamente, acabou por atrair os fugitivos nazistas para a mesma região.
Estabelecidos nesse estado brasileiro, os judeus não convertidos fizeram dessa terra, seu sagrado novo lar. Muito de seus costumes foram mantidos e suas festas tradicionais acabaram por enriquecer a já tão diversificada cultura local. Festas de comemoração do começo do calendário eram regadas de vinho e tortas de tâmaras e nozes. Estes festejos tornaram-se muito famosos e ficaram conhecidos para além dos muros culturais da comunidade judaica da região. O povo não judeu, assim chamado goy, tinha muita vontade de participar dessas comemorações, mas o tradicionalismo dos não convertidos impedia qualquer tentativa de aproximação da galera que não fosse da tchurma hebraica.
Depois de um tempo, começou a pegar mal esse isolamento. Por outro lado, os judeus (quase) ortodoxos sentiam que uma abertura plena para os festejos do calendário hebraico, aos gentios, poderia descaracterizar o próprio âmago simbólico dessas festas. Como então, resolver esse impasse? A resposta veio em um conselho de sábios pensadores do modo e vida judeu, realizado em Blumenau, no ano de 1948. Alfredo Rosa Rosenberg e Jonas Bauer escreveram um interessante livreto (Povo Hebreu, uma Nação em Forma de Coração, editora Paz & Terra, 1957, mas infelizmente fora de catálogo) contando toda a saga desse Conselho de 48 e suas importantes decisões. Sendo que a mais importante delas foi ter instituído a atualmente famosa “Farra do Goy”. Nela, a almejada e controlada mistura de culturas, foi finalmente colocada em prática. A festa consiste em duas partes básicas. Na primeira delas, o povo não-judeu, porém simpatizante, reunia-se em rodas animadas por muito vinho, tâmaras secas e olhadelas furtivas para as mocinhas judias que traziam os quitutes e os bebes. Nessa parte, o gentio se animava e ficava soltinho. Quando estavam no ponto, eram colocados para dançar e farrear com a comunidade judia (que também estava no mesmo grau etílico). Danças, conversas, brincadeiras, uns amassos daqui e dacolá , tudo fortemente controlado pelos mais velhos, permitiam uma aproximação (também controlada) de ambos os povos. Apesar dessa farra acontecer em uma única data específica do calendário, a longo prazo, ela também permitiu um suave mistura da nação judia ex-ortodoxa catarinense e os goys. Fazendo com o próprio termo acabasse em desuso na região e só sobrevivesse no nome dessa famosa festa.

21 fevereiro 2007

Por que ao bocejar quem está ao lado automaticamente boceja também?

Jaqueline perguntou:
Porque ao bocejar quem está ao lado automaticamente boceja também?

Icky Rocco perguntou:
Por que quando estamos conversando com uma pessoa, e esta boceja, automaticamente bocejamos também?

Prezados amigos sonolentos, o bocejo faz parte de um conjunto de comportamentos humanos chamados sociais contaminadores ancestrais. Outros comportamentos pertencentes a essa categoria é a famosa vontade de rir em velórios e missas e também a vontade de vomitar quando alguém acabou de chamar o Hugo, ao seu lado.
São comportamentos que, de uma maneira ou de outra, garantiram a sobrevivência de nossa querida espécie nesse mundo cão e cheio de perigos em que surgimos e vivemos até hoje (por enquanto, pelo menos!). Como todo mundo está careca de saber, o bocejo normal é um indicador de sono à vista. Regiões localizadas no tronco cerebral são responsáveis pelo ciclo sono-vigília, o nosso querido fluir entre períodos de estar acordado e dormir que os primatas tanto prezam. É uma loucura, quando dormimos, as áreas que nos mantêm acordados são desativadas por neurotransmissores inibitórios da turma do GABA e similares. Por sua vez, os circuitos ascendentes que fazem a gente viver acordado ficam todos acesinhos, louquinhos para passar impulsos elétricos para lá e para cá. Como disse anteriormente: uma loucura!
Quanto ao nosso querido bocejo, temos que lembrar que, se hoje em dia, ele no máximo provoca uma resposta similar no colega ao lado. Há muito tempo atrás, ele serviu para muito mais coisas.
Voltemos aos nossos primórdios hominídeos. Imaginem a vida nas cavernas, os primatas humanóides empoleirados uns sobre os outros, fugindo do frio, esquentando-se no contato dos corpos peludos e da fogueira feita com gravetos. Imaginem que esse esfrega-esfrega cotidiano deve ter mandado os períodos de cio para as picas (ops!). Ou seja, esse contato próximo recorrente, acabou com os períodos restritos de sexualidade que costumava acontecer nos outros mamíferos (cio) fazendo com que toda noite fosse uma legítima festa da macacada. Entenderam? Cause tonight is THE night! Toda noite era aquele fuzuê na caverna. Ninguém era de ninguém, hominídeo com mulherídeo, hominideo com hominídeo, mulherídeo com mulherídeo.
Nem preciso dizer que depois de um tempo, as raves tum-tum-tum da pré-história começaram a varar a noite e a continuar pelo dia afora. Noites e dias sem dormir embalados por peiotes e cogumelinhos estranhos encontrados no meio da caverna. Nem preciso dizer que, com o tempo, o povo foi ficando fraco, parou de cuidar direito da cria, nem transar mais eles conseguiam e, como diria Hipócrates, “tudo faz bem e tudo faz mal, depende da dose!”, com isso, a galera primata começou a minguar. Os poucos primatas que sobraram foram justo aqueles que conseguiam ir para a balada do roça-roça na noite, mas que dormiam antes, bem cedo, e depois acordavam lá pelas duas da manhã e caiam na gandaia até as primeiras luzes do dia, e dormiam de novo e acordavam renovados, para os afazeres diários. Porém, dormir cedo era um problema. Ainda mais com a ansiedade básica que batia nos corações, só de pensar na festa mais à noite. O que essa turma organizada (e a única que sobreviveu) fazia para dormir cedo? Bocejava. Um começava daqui, outro começava dali, depois de um tempo estava todo mundo bocejando sincronizados. Era como um ritual, um via o outro bocejando e forçava o bocejar também. Como o bocejo era (é) um sinal do sono que vem vindo, todo mundo, depois de um tempo, estava dormindo.
Com o passar das gerações, esse modo de vida sincronizado sobreviveu no modo de vida dos hominídeos sobreviventes que permaneceram adaptados ao seu meio. O que era apenas um comportamento intencional de bocejar coletivo foi se transformando em uma resposta comportamental contagiante. Ou seja, os indivíduos que eram mais influenciados pelos bocejos alheios e bocejavam também, dormiam mais rápidos, descansavam mais, participavam mais das festas orgiásticas noturnas e, por conseguinte, se reproduziam mais. Por sua vez, se reproduzindo mais, aumentavam as chances de seus genes facilitadores do contágio por comportamentos sociais serem transmitidos para seus descendentes. Concluindo o raciocínio, depois de muitas gerações, só sobraram os descendentes que bocejavam facilmente quando viam alguém bocejar perto deles (mesmo que nem mais dormissem juntos nas cavernas e etc.). É desses indivíduos que somos todos descendentes, hoje em dia. E esse comportamento contagiador é tão forte, atávico e arquetípico que gerou duas perguntas parecidas em pessoas diferentes e que nem se conhecem, sobre o mesmo asssunto do bocejar.

18 novembro 2006

NOTA DE ESCLARECIMENTO

o final do ano se aproxima o que ele os trabalhos e compromissos assumidos no decorrer do período. Isso quer dizer que estou cheio de coisas para fazer e por isso nao consigo responder as perguntas. Mas nao desistam do oráculo, as férias estão aí e eu'll be back

24 outubro 2006

Como uma pessoa pode sentir saudade de algo que não aconteceu?

Rosa Virgínia perguntou:

Como uma pessoa pode sentir saudade de algo que não aconteceu?

Prezada amiga Rosa, a resposta pode estar nas vidas passadas ou na física quântica. Como eu não acredito em vidas passadas, ficaremos com a mecânica das partículas infinitesimais para explicar esse fenômeno também conhecido como “recordações do futuro”.

O nosso velho amigo Einstein já dizia e provava que a velocidade da luz é a barreira máxima de velocidade que se pode atingir em nosso universo. Por que ele dizia isso, eu não tenho a menor idéia e estou com preguiça de procurar. Mesmo porque, para demonstrar meu raciocínio, não vamos precisar muito dele e de sua teoria, só um pouquinho. O que eu sei, e posso te dizer, é que conforme um corpo se acelera e se aproxima da velocidade da luz, sua massa vai aumentado e o tempo se dilata. Ao ponto de parar de correr o tempo quando esse corpo atinge a velocidade da luz (e sua massa fica infinitamente enorme). Não sei por que cargas d’água, a velô da light se torna uma barreira intransponível para qualquer coisa que exista no nosso mundinho universal do reino de Deus formado por partículas que se movem em velocidades abaixo dela.

Mas, minha cara Rosa, o que se comenta por aí, é que o fato da luz ser uma barreira inexpugnável não quer dizer que também não exista todo um(ns) outro(s) universo(s) na parte de cima da barreira, que não exista toda uma gama de partículas gerando e se configurando num universo cuja velocidade mínima seria a da própria luz. A barreira continua intransponível, mas delimita universos acima e abaixo dela. Voltando ao nosso querido Einstein, ele dizia (e provava) que se o tempo não anda quando atingimos a velocidade da luz, para velocidades ainda maiores, ele começa a andar ao contrário. Para as ligeiras partículas (táquions) desse mundo supra-velô-luz, o tempo anda para trás. E se ele anda ao contrário, numa relação causa e efeito, o efeito acontece antes da causa. A batida do carro acontece antes da freada, a gravidez antes da concepção, o remorso antes da coisa errada que se faz. E a saudade, antes do motivo que a causou. Dessa forma, os táquions passeiam em seu universo superior à velocidade da luz, configurando mundos em que o futuro já era e o passado ainda está para acontecer.

19 outubro 2006

Onde Judas perdeu as botas?

Maria José perguntou:
Já se sabe o local onde Judas perdeu as botas? O que fazia Judas para perdê-las, ir embora e nem se lembrar delas?

Prezada amiga Marilyn, nessa crescente onda revisionista que assola nossos tempos, é Mao que desce, é Mutantes que sobe, é Dan Brown que populariza o mito de Madalena on-the-rocks, líquida e cálice fonte da vida e da verdade, acabaram se salvando também o Wilson Simonal e o Judas, retirado que foram da categoria “traidores do movimento”. Vamos então, querida amiga, aos novos fatos sobre este importante personagem da mitologia cristã, trazidos à luz pela tradução integral dos manuscritos encontrados em uma caverna e conhecidos como Evangelho de Judas.
Judas Iscariotes (derivado do hebraico Ish Kerioth: homem de Kerioth, cidade ao sul de Judá), teve uma infância pobre, não ao ponto da miséria, mas foi bastante privado de coisas que seus amiguinhos de Judá estavam acostumados, pão de trigo e aveia achatado e comido aos nacos com mel e tâmaras. Azeite e carneiro desfiado. Roupas de tecidos finos vindos do Egito e da Pérsia, sandálias de couro de cabra e muito mais. Para Judas, só restavam os restos. Vestes de primos, pão sem aveia e mel, sopa de tutano de osso de carneiro e outros itens off price do mercadão central lá de Kerioth. Embora de resultado óbvio, esse modo de viver acabou por construir em Judas uma psiquê marcada pelo dualismo entre o ser e o ter. Se, por um lado, sua vida humilde despojava seu ego (na época ainda não tinha esse nome porque Freud estava bem longe no horizonte) de adornos e confeitos materiais, essa mesma falta também alimentava certo rancor da parte dele para com seu grupo sócio-histórico. Posso te dizer, Marilyn, que foi nesse embate que se construiu a personalidade de Judd, como era chamado pela turma, na época. Um embate cruel entre ser e ter, um briga poderosa entre o modus vivendis da Índia e dos States, dilacerando a alma do coitado, deixando-o sem rumo, paralisado pelo tudo-nada das inúmeras possibilidades de seu ser. A adolescência de Judas seguiu tranqüila, na medida em que podemos dizer tranqüila, de uma adolescência marcada pela necessidade de auto-afirmação e da supracitada dúvida entre o ser e o ter.
Logo depois que terminou o lavoreth sapie, que corresponde ao nosso atual ensino médio, Judd se lançou ao mundo que se constrói e se apresenta a um jovem adulto no vigor de todos os seus desejos (tanto físicos como emocionais). Foi trabalhar no curtume do tio e sua responsabilidade era limpar e preparar as peles dos animais abatidos para que pudessem ser aproveitadas na confecção de roupas, sapatos e acessórios para o povo que tinha moedinhas de ouro para pagar por eles.
A vida de Judas girava em torno do trabalho, que fornecia o substrato para sua existência e em torno de sua efervescente busca pela verdade e o equilíbrio entre suas necessidades básicas humanas e seus possíveis excessos. Preparar o couro poderia, nessa ótica, ser visto como uma metáfora da busca de sua jornada individual, ou em termos junguianos, seu processo de individuação: preparar a pele é construir o arcabouço que sustentará todas as vivências futuras de seu animus e de sua anima. Mas, como eu disse logo no começo, Judas era uma pessoa dividida pelo desapego de ser e o desejo de ter, E, por mais que sua jornada se elevasse, as punhaladas do querer ainda cravavam seu destino. A pobreza da infância o havia marcado muito. O fato de lidar com o couro também não ajudava a melhorar as coisas. Era dele que saia a matéria prima para artefatos que tanto ele havia cobiçado durante seu período de penúria. Sandálias, cintos, bainhas de punhais, pulseiras, botas, tudo estava lá, potencialmente, em suas mãos. Seu querer material era o magneto que o segurava e o afastava da elevação espiritual. Por conta disso, o jovem Judas Iscariotes economizou cada moedinha de ouro que chegou até ele durante dois anos. Privou-se de alimentos supérfluos, de bebidas fermentadas e de roupas mais confortáveis para realizar um antigo sonho: comprar uma bota de couro de cabra feita na Pérsia da marca Ohp anah khein e vendida nas tendas multimarcas da avenida central, uma espécie de Rodeo Drive, de Kerioth.
E lá foi ele, depois de dois anos, comprar suas botas. Estava excitadíssimo, o sonho de uma vida inteira, simbolicamente, estava sendo realizado. Nada de sofrer mais, por não ter. Nada de deixar de ser, por não ter.
Judas chegou emocionado em casa, com o embrulho de pelica que acondicionava as botas. Tomou um banho, espalhou uma pasta de mel e cânfora em seus pés cansados, enrolou-os em uma toalha quente e esperou a calma balsâmica tranqüilizar seus artelhos. Depois, colocou suas roupas mais bonitas (não necessariamente as mais novas) e vestiu finalmente seus artefatos de couro de cabra. Judas se sentiu bem, se sentiu muito bem, como nunca havia se sentido antes na vida. Aquela mistura de desejo realizado, satisfação garantida e conforto extremo, proporcionada pelo forro duplo de couro de porco e pelica, misturados à elegância do couro de cabra, perfeitamente trabalhados pelos sapateiros persas, provocou em Judas algo parecido à calma que os amantes experimentam depois de terem satisfeitos suas necessidades carnais. Judas chorou. Verteu lágrimas de felicidade, de comoção pela vida dura que seus pais haviam levado em sua infância. Derramou lágrimas por ter atingido seu sonho.
Durante as semanas que se seguiram, Judas e suas botas formaram um único ser. Eram a mais perfeita tradução da idéia de acoplamento estrutural cunhada por Maturana e Varela quase dois mil anos depois. Por mais que ele as usasse, seus pés não doíam, não cheiravam mal e elas permaneciam intactas mesmo diante das chuvas e tempestades que enfrentavam. Seus pés mudavam e as botas mudavam com eles.
Nesses tempos iniciais, a bipolaridade da psique de Judd permaneceu tranqüila, parecia até mesmo que tudo havia sido resolvido e que ela não existiria mais. E foi assim por um bom tempo, meses, anos, Judas e suas botas, para lá e para cá, conforto extremo sempre.
Depois de muito tempo, o homem de Karioth começou a sentir, sem saber ao certo, um desconforto emocional, uma insatisfação na alma provocada por um querer ser, mais do que ter. Era como se o estado de plenitude física desencadeado pelas botas entorpecesse seu corpo e o ruído de fundo que ele fazia (na forma de dores e incômodos), subitamente, silenciasse, deixando os anseios da alma em evidência.
E assim foi, cada vez mais nítido e claro, seu espírito pedindo mais, querendo compreender mais, envolver-se mais, ao ponto de Judas começar a desejar pelo silêncio de seus desejos, de suas dúvidas. Ao ponto dele não mais querer o conforto de seus pés e a conseqüente amplificação que ele (o conforto) induzia em seus questionamentos emocionais e/ou metafísicos. Para ele, só existia uma forma de resolver essa situação: livrar-se das botas persas de couro de cabra e forro de pelica e porco. Mas como fazer isso num sistema pé-bota em perfeita harmonia? Como se livrar de algo que era a resposta para todas a suas mágoas infantis? Nunca ele poderia se livrar delas, Judas sabia disso com clareza e aí então fez a única coisa possível de ser feita: caminhou com elas. Andou, andou e andou pelas terras vizinhas, pelas terras conhecidas, por toda Judá, pela Pérsia, pelo Egito, Babilônia, caminhou com elas por anos, indo o mais longe que pode ir. Conheceu povos diferentes e costumes estranhos. Andou até onde pode, depois voltou e, apesar do conforto, suas botas começaram a se desfazer, mansamente começaram a desintegrar-se. Assim, em seu longo retorno para casa, para Kerioth, seus pés foram vagarosamente sendo despidos. Quando tocou o solo dos arredores de seu lar, quase mais nada existia a cobri-los. E ele pode então, adentrar sua casa descalço, mais maduro, crescido e pronto para encontrar aquele que, radical e novamente, mudaria sua vida.

Prezada Marilyn, Judas perdeu suas botas em sua própria casa depois de uma longa (em todos os sentidos) jornada de busca e crescimento que mais uma vez no remete a Jung e seu processo de individuação. Por isso que a expressão é usada, hoje em dia, para designar um lugar muito longe e inacessível, como nós mesmos o somos. Tão longe, tão perto!

16 outubro 2006

O côncavo é um convexo ao contrário?

André Nobreza perguntou:

O côncavo é um convexo ao contrário?

Prezado André, filosoficamente sim, pois na essência de toda concavidade está contida o seu oposto. Segundo o teorema de Schultz, todo espaço que se curva e se deforma, produz uma potencialidade de deformação igual, só que em sentido e valor contrários. O termo potencialidade é muito importante e está no cerne do pensamento sistêmico topográfico de Henry Schultz. Ele indica a possibilidade de acontecimento, que não necessariamente é realizada no devir da situação. É como se o cosmo se abrisse ao ser curvado e oferecesse, em contrapartida, uma outra solução possível (mas não real) ao ponto de instalação de novidade formado pela curvatura espacial. Schultz passou grande parte de sua vida demonstrando matematicamente essa “brincadeira topográfica” do universo conhecido. Seu famoso teorema [ Ci = -(p.ve/cr2)] pode ser explicado de uma maneira simples como: a curvatura imaginária (ci) é resultante do valor negativo da possibilidade de curvar (p) multiplicado pela variação do espaço (ve) dividida pelo quadrado da curvatura real (cr). Um dos primeiros desdobramentos desse teorema foi sua aplicação (com as devidas adaptações para velocidades próximas à da luz) na curvatura dimensional provocada pela enorme quantidade de massa encontrada nos buracos negros. DeBruniere e Palma, num excitante artigo de 1982 chamado “Where’s the light? Is possible to massive black holes behaviours like tears in the rain?” publicado pela Science and Universe ampliaram o teorema acrescentando variáveis cosmológicas específicas como, por exemplo, a possibilidade de deformação temporal e a topografia do horizonte de eventos. Os autores, nesse artigo, demonstraram matematicamente que toda matéria condensada pela estrela colapsada produz uma concavidade espaço-temporal em nosso universo e, concomitantemente, uma possibilidade de convexidade no universo para qual toda matéria (da estrela) está sendo enviada. Assim, ampliaram o conceito filosófico de côncavo e convexo, demonstrando matematicamente a possibilidade de sermos um universo côncavo de um outro convexo.

15 outubro 2006

Por que os carneiros choram ao serem abatidos?

Jaqueline Sartori perguntou:
Por que os carneiros choram ao serem abatidos?

Prezada Jaqueline, o fardo que os carneiros carregam, vivendo entre os humanos e os deuses desde os tempos imemoriais, é tão pesado e denso, em termos mitológicos e arquetípicos que, muito me espantaria, se eles não chorassem ao morrer. São criaturas tão doces, tão impregnadas de candura que sua própria carne tem um sabor adocicado. Viver o que viveram ao lado dos deuses, ao lado da prima manjedoura cristã, serem oferecidos como sacrifícios. Ter sido o animal preferido de Zeus e ter a pele coberta por um manto de ouro. Ser uma constelação, um signo, um símbolo, um sinal. Tudo isso é muito peso e muita responsabilidade para uma raça. São eles, os carneiros que, com seus rebanhos, nos pastoreiam em nosso existir. Eles que impõem limites ao nosso caminhar pela vida, enxertando serenidade e calma, aconchego e lã ao nosso viver. Sim, minha cara Jaqueline, jamais se iluda, são eles que nos pastoreiam e somos alguns de nós que, de vez em quando, desgarramos do bando e nos afastamos do rebanho, para longe da luz. Eles choram porque já experimentaram a dor da perda quando são tosquiados em todos os verões e pressentem que vão morrer. Por tudo isso eles choram, porque ao serem abatidos eles já viveram antecipadamente esse triste fim a eles imposto por nós. Justo nós, que eles tanto (e desde as mais remotas eras) têm protegido.

O que Deus significa para você ?

Jose Luis perguntou:
O que Deus significa para você ?

Deus, para mim, sãos aqueles fachos de sol entre as nuvens no final do dia. É um grande pai de barba e cabelos longos e brancos. É alguém que vê quando fazemos algo errado no banheiro e depois nos castiga, para o nosso próprio bem. Deus, para mim, é um triângulo com um olho no meio. Já foi Ra, Osíris, Zeus, Quetzalcoatl, Odin. É Tupã e os Orixás, já teve um filho chamado Buda, Messias, Moisés, Jeová, Cristo e Maomé. Deus, para mim, é o fruto da capacidade de perguntar (e de não conseguir responder) dos seres humanos.

13 outubro 2006

O que é a realidade?

Tiago Martins perguntou:
Tenho uma dúvida que me tira o sono: O que é a realidade?

Prezado ser ontológico Tiago, esta questão é muito simples de responder, a realidade é um artefato do observador. Poderia parar por aqui, mas acho que você ficaria chateado. O que quero dizer com isso? A realidade é uma construção coletiva de todos os seres cognitivos que vivem nela. A famosa duplinha de neurobiólogos chilenos, Maturana e Varela, dizia que “tudo que é dito, é dito por alguém”. O que significa que vivemos na linguagem e é nela que definimos o que existe e o que não existe. Ou seja, o que não podemos distinguir, não existe. Essa duplinha de pensadores teve uma sacada genial que foi dizer que, por trás de tudo que é dito (ou escrito, visto, ouvido, cheirado, pensado, sentido e etc.) existe a figura daquele que diz. E, mais que isso, que é impossível separar o que é dito daquele que diz. Dessa forma, é impossível definir o que é realidade (dizer o que é realidade) sem levar em conta aquele que define o que ela é. O pessoal da mecânica quântica já tinha sacado isso uns tempos antes. Já tinham percebido que quando o experimentador tenta medir alguma coisa subatômica, essa variável se altera pela própria experiência de medi-la, ou seja, não existe coisa subatômica isolada daquele que distingue essa coisa (através da linguagem).
Nossos queridos autores, em seu (quase) acessível livro “A Árvore do Conhecimento”, nos dizem que tudo que acontece em nós é determinado pela nossa estrutura. Dessa forma, nossos órgãos do sentido não captam aspectos de uma realidade objetiva que exista independente de nós porque quem determina o que pode ser um “estímulo” para nossos sentidos é a própria estrutura desses órgãos. Vamos a um exemplo dramático e violento, se eu pego um pedaço de cano e acerto seu braço com toda força, muito provavelmente vou quebrar seu osso, arregaçar sua pele, vai sair sangue e etc. (eu disse que seria violento). Mas, quem fez isso com seu braço? O cano? Ou a estrutura de seu próprio braço?
A ação do pedaço de cano é apenas uma perturbação à estrutura do braço, quem determina o que acontece com ele é sua própria estrutura (de carne, osso e sangue). Se eu pegar esse mesmo cano e tentar arregaçar o braço do Iron Man não vou ter tanto sucesso assim. O que mudou de um caso para o outro? A estrutura de cada um.
Por isso, podemos dizer que somos seres determinados estruturalmente. Tudo que acontece conosco é determinado pela nossa estrutura. Se assim o é, não pode existir nenhuma interação nossa com o meio (com a realidade) que seja instrutiva porque nossos órgãos do sentido não captam aspectos objetivos de uma realidade externa e sim são perturbados apenas pela gama de estímulos que suas próprias estruturas (dos órgãos do sentido) definem como perturbação possível. Os seres vivos definem em seu viver e pelas características de suas estruturas, o que é (são) a(s) realidade(s) possível(eis) de existir(em).
É por isso que a realidade não é uma coisa pronta e sim algo que foi dito por alguém, cujo próprio operar nessa realidade também é construtor desse dizer. Resumindo, podemos dizer que a realidade é conseqüência (e também causa) do operar de um sistema cognitivo em seu próprio meio.

09 outubro 2006

Como fazemos em relação a este mercado, onde a ética é ausente e a estupidez predomina?

Cenimar Soares perguntou:
Como fazemos em relação a este mercado, onde a ética é ausente, a imposição impera, e a estupidez predomina? Fazemos o trabalho engolindo o sapo, que não é pequeno, ou assumimos uma postura que é só nossa?

Prezada Cenimar, não tem jeito, não tem escapatória. A partir do momento em que você construiu um mundo ético para você e suas relações, sempre existirá esse confronto e esse eterno sofrer que é trombar com um mercado frequentemente não-ético. O grande aprendizado é sobreviver aos embates sem perder sua identidade, seus valores. Mas será possível chafurdar na lama e sair limpo? William Hughs em seu primoroso ensaio sobre a natureza humana (Existence and coexistence. 1923), nos diz que a falsa idéia de que é possível sair incólume de uma coexistência com grupos não éticos, produziram os maiores crimes da humanidade e dentre eles, podemos citar a ascensão do nazismo na Alemanha pós primeira guerra mundial. Essa noção de impossibilidade de compartilhamento com núcleos não-éticos é concomitante com as poéticas palavras de Nietzche: “se olhares para dentro do abismo, o abismo olhará para dentro de ti”. Em palavras menos nobres: “abraçou o gambá, saiu fedendo!”. Ou seja, particularmente, não acredito na falta de ética sustentável, na falta de ética que não prejudique o meio ambiente. Não que eu não a pratique, sometimes é impossível ser totalmente ético. A grande diferença é sempre saber que estamos errados quando estamos errados. Essa noção limita nossas ações não éticas circunscrevendo-as por limites éticos sólidos que acabam por impedir sua disseminação e contaminação do restante de nossas outras atitudes.
Resumindo, na prática, não existe possibilidade de viver na lama e sair limpo. Porém, o uso de equipamentos adequados pode fazer com que evitemos os lamaçais, mesmo que tenhamos que dar mais voltas e caminhar muito mais, para chegar até nosso almejado destino.

07 outubro 2006

Bacalhau é um peixe ou um processo de estocagem?

Pádua perguntou:
Afinal de contas bacalhau é um peixe ou um processo de estocagem?

Prezado amigo Pádua, no início, quando Odin reinava em Valhala, os peixes bacalhaus salpicavam os mares gelados da terra fria que existia sob seu reino. Naquela época, ele era um peixe servido como fina iguaria, tanto nos banquetes do reino mítico, quanto em comilanças organizadas pelos vikings conquistadores. Um pequeno poema dessa época retrata de maneira precisa a importância da comida no modo de vida desses bárbaros:
“Em meu rosto,
um frio e lento sol pálido
a lembrar de casa.
Se olho para o alto,
vejo as cores da boreal,
se olho para o barco,
a sua volta,
bacalhaus de prata sabem
que seu destino é nos alimentar.”
Esses pobres vikings, obrigados que eram a passar grande parte de suas vidas viajando, guerreando e conquistando novos territórios, tinham problemas graves de estocagem de alimentos. Em suas queridas e ausentes casinhas, deixavam o peixe devidamente congelado, pela imensa geladeira natural que possuíam, na maior parte do ano, em volta da casa. Porém, como levá-los quando singravam os mares? A resposta veio na forma de um processo relativamente simples, criado por suas esposas, que consistia em limpar os peixes, tirar as escamas e vísceras e salgá-los. Depois, eram prensados para serem estocados em grande quantidade, sem ocupar muito espaço e durarem bastante tempo.
Com exceção do fato de terem que comer nacos salgados de peixes em alto mar, a vida dos vikings melhorou muito após essa invenção de suas dedicadas mulheres, já que eles podiam levar um pedacinho do lar para onde quer que fossem.
O que começou como uma pequena melhoria na dura vida dos conquistadores, foi crescendo, crescendo e se transformou num produto de exportação de aceite mundial. E daí, óbvio, o que era artesanal, virou industrial e acabou com a maioria dos peixes bacalhaus. As, nessa altura do campeonato, grandes corporações pesqueiras percebendo a queda nas exportações, ampliou o famoso processo de salgagem para outras espécies de peixes. Por isso, o que era uma iguaria única se transformou, hoje em dia, em um processo de estocagem.

Por que tudo vale a pena se alma não é pequena?

Mazé perguntou:
Por que tudo vale a pena se alma não é pequena? Vale pras coisas boas e ruins?

Prezada amiga Marilyn, a alma é nosso reservatório de humanidade, seu crescimento é promovido pela vivência que temos, vivendo a vida que vivemos, juntos aos outros seres humanos. Portanto, não ter uma alma pequena significa ter repertório suficiente de humanidade para acolher os fatos da vida, digerindo-os e tornando-os parte de nosso ser. Sob esse ponto de vista, até as coisas ruins valem a pena, já que, quando imersas no grande salão de nossa alma, se diluem e são atenuadas pelas inúmeras felicidades que ali residiam há mais tempo.

02 outubro 2006

Por que mandavam a gente comprar baton?

Vera Millioti perguntou:
Por que mandavam a gente comprar baton?

Prezada e infinita amiga Vera, no início da década de oitenta, o imperialismo ianque sentiu que seus métodos tradicionais de opressão e imposição de valores e costumes, começavam a fraquejar. Não sei se pelo excesso de pessoas conscientizadas, se pelos formadores de opiniões que, após estudarem em escolas politizadas, começaram a contestar as horripilantes técnicas que o grande satã costumava usar para arrematar suas hostes de escravos, tudo começou a declinar. Você assistiu ao filme, não assistiu? O declínio do Império Americano. Pois é, dando uma bela resumida, os ianques perceberam que métodos mais sutis de doutrinação, poderiam acarretar um melhor resultado frente à população esperta que precisavam converter. Uma de suas mais famosas campanhas de programação foi a famosa publicidade do chocolate Baton. Designaram um jovem médico chamado Lair Ribeiro para coordenar o núcleo de atuação do P.A.M.M.I.S. (Programa de Alteração Mental Mediante Indução de Serotonina) no Brasil. Este programa sórdido baseava-se em estudos que haviam comprovado que o neuro-transmissor central serotonina (5-HT) é responsável por estados de tranqüilidade e satisfação no sistema nervoso central. Vale a pena lembrar que, na nossa cabecinha, existem zilhões de conexões entre os neurônios chamadas sinapses. O mais bonito numa sinapse é que, apesar dos neurônios se conectarem e transmitirem “informações” uns para os outros, eles nunca se encostam. Existe sempre uma fenda, um buraco entre eles, pelo qual a informação elétrica de um precisa pular para chegar até o outro. O coitado do impulso nervoso chega até a porta do buraco e não sabe como chegar ao outro lado. É nessa hora que entram em ação os neuro-transmissores, eles são os barquinhos que levam o pobre impulso nervoso de um lado para o outro, através da fenda sináptica. A serotonina é um desses neuro-transmissores e, quando é despejada em baldes em nosso cérebro, produz uma sensação de bem estar. Ou seja, níveis elevados de serotonina são encontrados em pessoas de bem com a vida, prestes a atingir o orgasmo, usuários de drogas e pessoas que comem muito chocolate. Como pegava muito mal para o P.A.M.M.I.S. lidar com a sexualidade emergente (ou mesmo com o uso de drogas) das crianças pré-púberes que seriam o público-alvo do projeto, optou-se pelo uso do chocolate como fator indutor da elevação da serotonina central. Esse poder do chocolate é bastante conhecido e, ao elevar a serotonina cerebral, produz uma ampliação da consciência e um relaxamento das defesas mentais para as novas idéias (ou ordens ou instruções). Percebeu, né? Crianças indefesas são induzidas, por uma massiva campanha publicitária, a comprarem chocolate de uma forma explícita e nem um pouco subjetiva. O anúncio era claro: Compre Baton! Atuava como um mantra hipnótico que enviava as pequenas criaturas para as mercearias, os bares e as cantinas escolares em busca do pequeno tubo de cacau e açúcar. Depois, dopados que estavam, suas cabecinhas virgens eram manipuladas pelos lacaios do imperialismo e seu plano sujo e torpe. Por um bom tempo, a coisa funcionou tão bem que, mesmo sem saber por que, até hoje as pessoas ainda se perguntam: por que mandavam a gente comprar baton?

01 outubro 2006

Qual o nome cientifico do bicho-grilo?

Victor perguntou:
Qual o nome cientifico do bicho-grilo e qual seu ancestral na evolução?

Prezado amigo Vital, o nome científico do bicho-grilo é Grillus hare grillus. O termo latim grillus significa, obviamente, grilo e o termo hare é uma expressão de saudação e exaltação ao reino dos filhos do cosmos. A colocação do segundo termo grillus tem como objetivo tornar o nome do bicho-grilo uma saudação mântrica semelhante ao famigerado hare krishna hare, fazendo uma alusão sutil às práticas sócio-filosóficas-culturais da espécie.
O ancestral do Grillus hare grillus é o Kerouac road sp. Ele viveu em grande parte do território da América do Norte durante a década de quarenta/cinquenta e era notório por seus longos questionamentos sobre a existência e a vida, sempre transcritos na forma de poemas de versos soltos. O Kerouac road sp, por sua vez, pode ter surgido como uma adaptação ao novo mundo de um outro ancestral encontrado no velho continente chamado Hesse sartre e que teria vindo para a América transportados por cargueiros da Lord e lavando porões. Quando perguntados sobre qualquer coisa, costumavam terminar suas respostas com a seguinte frase: “Se oriente, rapá!” Mas isso já é uma outra história.

Quem é o Homem da Cobra?

Icky Rocco perguntou:
Qual a origem da expressão: Fulano fala mais que o homem da cobra!
Quem é o Homem da Cobra?

Prezado Icky, em meados do século 19, no sul de minas, mais exatamente na cidade de Monte Santo de Minas, morava uma família cujo patriarca havia imigrado para o Brasil, proveniente do sul dos Estados Unidos. Seu nome era Charles Seven e veio para cá após uma série de incidentes ocorridos em sua cidade natal que não são relevantes para o restante de nossa história. Logo que chegou aqui, Mr. Seven se estabeleceu como um proeminente emprestador de dinheiro, no início, e um eminente banqueiro, depois de um curto intervalo de tempo. Charles, com seus quase dois metros de altura, pele branca e sardenta, um legítimo red neck, logo atraiu a atenção das mocinhas casadoiras da região. O que tinha de sinhá moça chovendo em sua caixa registradora era um absurdo. Mr. Seven logo se enrrabichou por Do Carmo, pele branca, cabelos negros e olhos de jabuticaba. Tiveram vários filhos e foi assim, de forma resumida, que começou a se consolidar o clã dos Seven. Naquela época, Mr. Seven praticamente financiava mais da metade dos custos agrícolas das outras famílias da região envolvidas com a plantação de café. Charles, porém, era implacável a respeito dos prazos e juros relativos a seus empréstimos. E também era muito temido por isso. Era o famoso “Homem da Cobrança” e fazia de tudo para reaver algum valor emprestado e não pago no devido tempo. Charles Seven era capaz de falações e discursos intermináveis que produziam o efeito de um mantra hipnótico em seus devedores, como algumas cobras supostamente são capazes de paralisar suas presas, fazendo com que eles acabassem por pagar o que deviam a ele. Preciso explicar mais alguma coisa? O homem da COBRAnça, ou seja, fulano fala mais que o homem da cobrança ... Com o passar do tempo: fulano fala mais que o homem da cobra. Numa corruptela da palavra original e numa alusão inconsciente ao imaginário popular que atribuía esse efeito mesmerizador aos supracitados ofídios.

Exercícios físicos garantem uma velhice saudável?

Shirley Rizzi perguntou:
Exercícios físicos garantem uma velhice saudável?
E o que fazer com a artrite, artrose, reumatismo e bico de papagaio?

Prezada amiga Shirley, exercícios físicos podem garantir uma velhice saudável desde que você não comece a praticá-los aos oitenta anos. Para que o crepúsculo existencial humano seja flexível e saudável, ele tem que ter sido conseqüência da prática controlada dos movimentos musculares e alongamentos tendonísticos executados também anteriormente à época do referido crepúsculo. Se assim não for, os exercícios podem realmente afetar nossas estimadas marcas do tempo, impressas que estão, em nossos corpos. Recomendo, no caso de aproximação com a maturidade e ausência de atividade física regular, a consulta de um profissional da área que não seja produto da moda vigente no setor e que saiba entender as limitações que anos de uso indevido possam ter provocado em nossa, velha de guerra, porém amada carcaça.

Por que a água gira no ralo da pia?

Keico Nonaka perguntou:
Por que a água gira no ralo da pia em sentidos inversos nos dois hemisférios da Terra?

Prezada amiga Keico, prepare-se para surpreendentes revelações, tão surpreendentes que até eu fiquei surpreso! A história da água rodar em sentidos inversos nos dois hemisférios terrestres é uma falácia, um mito científico moderno atribuído à força de Coriolis. Em seus estudos, Coriolis verificou que em um sistema em rotação há uma força que afeta o movimento de um corpo de maneira diferente no hemisfério sul e no hemisfério norte e é de intensidade nula no Equador. É essa força, resultante da forma e movimento rotacional do planeta, que faz com que os redemoinhos de vento do norte rodem ao contrário dos redemoinhos do sul. Para aplicá-la ao pequenos redemoinhos formados nas nossas pias foi, então, um passo. Porém, cálculos mostraram que a magnitude dessa força, na pequena quantidade de massa de água de nossa pia, é desprezível e não influencia em nada no sentido de rotação de nosso pequeno fruto da ira de Poseidon. E durma-se com uma decepção dessas!

Para maiores informações: http://www.projetoockham.org/boatos_coriolis_1.html

30 setembro 2006

Como fazer um ser humano?

Marcelo Ferrari perguntou:
Como fazer um ser humano usando apenas os ingredientes e utensílios domésticos de uma cozinha?

Prezado amigo Ferrari, inicialmente teríamos que ter muita água, quase setenta por cento do meu ser humano seria feito de água, de torneira mesmo, sem filtragem, porque a vida é suja e torta e perdemos tudo que tínhamos de pureza naquela m*rda de paraíso. Faria uma massa básica de farinha e água que é o mais perto que poderia chegar do Adão (feito de barro por Deus) e do mito hebraico do Golam (feito de barro pelos homens). Amassaria essa mistura com as mãos, porque acredito em algumas regras básicas dos rituais de transformação. Barro, homem, massa, pão, corpo sagrado, comunhão. Assaria meu humano moldado e crescido, após fermentação, num leito de leite e mel e em forno elétrico para que os elétrons saltitantes, transformados em calor, solidificassem todas as promessas incrustadas nesse meu proto-sapiens, nesse meu frankstein prestes a receber a energia vital. Depois, deixaria o resto com a vida, com o tornar-se humano que é o viver junto e em comunidade/comunhão, repartindo o pão com os outros humanos.

Por que os maridos nunca percebem?

Rosana Fachin perguntou:
Por que os maridos nunca percebem o que nós - esposas - esperamos que eles façam?

Prezada Rosana, eu poderia começar essa resposta dizendo que os homens são de Marte e as mulheres são de Vênus, mas não vou dizer porque isso é mentira. Homens e mulheres são do planeta Terra, só que vivem em sintonias diferentes. Coexistem, só que de maneiras diferentes. No caso de maridos e esposas, tudo se torna um pouco mais denso e complexo porque é a diferença de sintonia natural dos gêneros obrigada a conviver e repartir o espaço-tempo. O abismo que existe entre nós é infinito e semelhante ao que existe entre o 0 e o 1 no conjunto dos números fracionais. Quanto mais tentamos nos aproximar, mais nos afastamos, assim como, por mais que dividamos a distância entre o 0 e o 1 em pequenas frações, nunca chegaremos ao zero, nunca atingiremos o outro lado, a outra margem do rio. Aqui estamos nós, aí estão vocês. A possibilidade de compreensão entre os gêneros, às vezes se torna quase um fato, quase achamos que podemos tocar a alma alheia, compreender e ser compreendido por ela. Essa sensação mágica de proximidade, de ter estado tão perto, renova nossas esperanças no impossível e continuamos a acreditar no quase encontro. Tornamos-nos, então, cheios de certezas e de quereres em relação ao outro que, por sua vez, continua a navegar em outros mares.

25 setembro 2006

Dúvidas sobre a corrupção

Lau perguntou:
Se não houvesse corrupção, o Brasil seria melhor?
Existe algum lugar no mundo, onde tenham humanos e não tenha corrupção?
Existe grande ou pequeno corrupto?

Prezado amigo puro, não posso afirmar com certeza se o Brasil seria melhor, pois isso é um exercício de imaginação tão teórico quanto imaginar para onde foi a luz tragada pelo horizonte de evento de um buraco negro. Podemos até assuntar, calcular, mas a vida real é muito mais complexa e surpreendente. Talvez as coisas fossem menos ruins para a grande parcela da população que vive mal, come mal, dorme mal e etc. Mas para mim, para você, para nossa classe medinha, será mesmo que faria alguma diferença? Acho que nossa vida não é melhor por nossa conta mesmo. Por sempre estar querendo mais e mais coisas que não podemos mais viver sem. Eu, por exemplo, atualmente tenho sido consumido pela possibilidade de trocar meu nano 2 gb por um de 8 ou um de 80. Isso tem definido minha existência medinha , nesse momento. Se não existisse corrupção, talvez eu estivesse em dúvida entre o de 80 e um power mac tela 20 polegadas wi fi com vista para o mar. Mas eu seria melhor enquanto ser humano? Com certeza não! Alias, um dos poucos benefícios dessa corrupção toda é a gente pensar que somos seres melhores e mais evoluídos do que eles. Talvez o único lugar onde tenham humanos e não tenha corrupção seja entre os internos de uma UTI, ou entre as ossadas humanas num cemitério. Com certeza, existe o grande e o pequeno corrupto. Os grandes são eles, e os pequenos somos nós que estacionamos em fila dupla, só um pouquinho, sonegamos impostos, compramos recibos de médicos e derivados para enganar o imposto de renda, furamos filas, pedimos empregos pros políticos, ficamos quietos quando discordamos de alguma coisa na nossa empresa para não sermos demitidos, catamos músicas e filmes de graça na rede, subtraímos cartuchos de tinta do escritório e registramos nossa empregada, quando registramos, por um salário menor do que ela ganha.

24 setembro 2006

Qual a cor do burro quando foge?

Paulo Rocco perguntou:
Qual é a cor do burro quando foge?

Originalmente todo burro que vai fugir tem cor branca. É uma norma adotada pela convenção da categoria no ano 300 da era cristã. A escolha da cor branca representa simbolicamente o ponto de partida de todas as possibilidades de vida que esse burro, prestes a fugir, terá a partir do momento em que ele romper com os laços de sua vida tacanha e se lançar pelas estradas. É o símbolo da pureza, assim como o branco o é quando impresso nos vestidos alvos das noivas de outrora. Essa cor representa a tela em branco que o animal é e na qual será impressa toda sua história de vida resultante da fuga. Mas não se iluda, eu disse que todo burro que VAI fugir tem cor branca, porém o tom de neve de seu couro pode se transformar pelo próprio processo de fugir numa construção em que não conseguimos mais delimitar com certeza o que é constituinte do ser e o que é resultante do processo. Exemplificando, se o burro foge por uma estrada de terra, o tom de seu couro se constrói num acoplamento estrutural entre o organismo vivo e o meio-terra, transformando a resposta para sua pergunta em terra siena queimada. Se ele foge pela relva, entre vegetações baixas e arbustos floridos, o acoplamento estrutural resultará numa resposta cromática que tenderá ao branco salpicado de partículas de verde musgo e outros tons das folhas e flores da relva. O importante é lembrar que o branco efêmero simboliza a promessa de liberdade e possibilidades e que a cor resultante da fuga será feita numa co-construção envolvendo o burro, o ambiente e o observador.

Por que eu nunca vi enterro de anão?

David perguntou:
Por que eu nunca vi enterro de anão?
Prezado amigo David, por uma simples questão de probabilidade e estatística. Apesar de não ser minha função primordial, uma intervenção interrogativa se faz necessária para que possamos continuar essa conversa, por isso, pergunto eu: Quantos anões tu conhecestes até hoje em sua vida? Responder o Tatoo da ilha da fantasia, ou os coadjuvantes de programas pastelões de sua infância, não vale. Provavelmente sua resposta será: nenhum ou, no máximo, você terá conhecido um anão. E esse anão? Terá feito ele parte, emocional e temporalmente, significante de sua vida para que ainda estivesse próximo a ele quando por infelicidade, ele viesse a falecer? Viu? Apesar das inúmeras contra-perguntas que usei nesse texto, elas apenas foram usadas para clarear o raciocínio das probabilidades baixas que temos de conhecer um anão, ser amigo dele e, ainda mais, ter um vínculo suficientemente longo com ele (ou ela) que permita que a carta sem nome do tarot ceife sua vida e nos convide para o enterro.

Os gambás têm bolsas?

Clederson perguntou:
Os gambás têm bolsas para carregarem seus filhotes assim como os cangurus?

Prezado Kledir, os gambás, assim como os cangurus, são marsupiais, ou seja, seus filhotes nascem “antes do tempo”, incompletos e ainda embriões, e depois completam seu desenvolvimento na bolsa que suas mães possuem. É uma festa, bolsinha quentinha, alguns mamilos para mamar direto da fábrica, som ambiente gastro-intestinal e pulsões do coração para alegrar a filhotada. Porém, nos gambás (e aqui vai uma outra explicação, aquele gambá preto e branco dos desenhos animados não são marsupiais e, em português, seu nome correto é cangambá) os filhotes ficam até completar seu desenvolvimento e depois que nascem, costumam ser transportados nas costas da mãe, agarrados aos seus pelos. Já o canguru baby é mais folgado e costuma continuar a freqüentar a bolsa materna mesmo depois de estar em condições de circular por aí. Por isso que sempre associamos bolsa materna com filhote, com canguru.

23 setembro 2006

O que aconteceu com o bairro de Higienópolis?

Renata perguntou:
Quando eu era pequena, sempre me disseram que eu morava no bairro de Higienópolis. De repente, sem me mudar de casa, passei a morar no Centro. Gostaria que o oráculo me respondesse o que aconteceu com o bairro Higienópolis: nunca existiu ou como Atlântida, o bairro desapareceu?

Prezada Renata, em 1905, quando Einstein publicou sua teoria da relatividade especial, muita coisa mudou na física e também em outras áreas do conhecimento humano. Para ele, nenhum objeto se distingue por proporcionar um marco de referência absoluto em repouso. Desta forma, tanto faz você afirmar que um trem se desloca em relação à estação como afirmar que a estação se desloca em relação ao trem. Depende do que você adotará como referencial. Ou seja, tudo é relativo. Quando você era pequena, a cidade era menor e a área correspondente ao centro da cidade também era mais circunscrita. Poderíamos dizer que o downtown se limitava aos prédios que se localizavam ao redor da praça XV e da catedral da cidade. Logo acima (e já que estamos falando em relatividade, se tomarmos como referencial o ribeirão da avenida chico junk) do centro, ficava seu amado bairro onde nascestes. Mas a cidade cresceu, e cresceu muito, o referencial mudou e o ponto central tornou-se muito maior. Um interessante complemento para se entender esse processo é a teoria de Poincaré sobre um fio de linha que desenha uma curva fechada sobre a superfície de uma laranja. Segundo esse eminente matemático do começo do século passado, qualquer ponto na casca dessa laranja pode ser deformado até ser transformado na própria superfície da laranja. É o que tem acontecido com nossa (e outras) cidade. A expansão e crescimento demográfico geram um maior crescimento habitacional, com o conseqüente aumento da superfície topográfica urbana que expande o ponto inicial central, conforme previsto na teoria de Poincaré. Dessa forma, de uma maneira semântica e existencial, o ponto central engole áreas adjacentes como um buraco negro engole a matéria e a luz que marcou em existir ao seu redor. Não se preocupe, fisicamente seu bairro continua aí, apenas sua classificação foi mudada por ter sido engolfado pelo centro da cidade em expansão.
Para ler sobre o Einstein: http://www.lucalm.hpg.ig.com.br/mat_esp/relatividade/relatividade.htm

E para ler sobre o Poincaré: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR75159-6014,00.html

22 setembro 2006

Por que sempre que marcam um show ao ar livre chove?

Renato Vieira Andrade perguntou:

Por que sempre que marcam um show ao ar livre em Ribeirão chove?

Prezado amigo incorformado com as águas que caíram nas altas noites. Jonathan Kaplan, conceituado neuro-eletro-físico de Cambridge, pesquisou durante anos a condução dos impulsos nervosos pelas fibras mielinizadas dos axônios e dendritos dos mamíferos mais desenvolvidos filogeneticamente. Todo mundo se lembra daquela viadagem das mebranas que deixam passar sódio para cá, potássio para lá, criando uma eletricidade. Jonathan provou que a somatória de pequenos campos elétricos gerados por todos os impulsos nervosos produz um campo elétrico pessoal e particular de cada pessoa. Anos depois desse seu trabalho pioneiro (The nature of the human electric fields, Kaplan, J. C. and cols. Science, 1984) o famoso pesquisador, durante uma temporada na UFBA em Salvador, ampliou seu conceito inicial de campo elétrico humano gerado pela atividade elétrica nervosa total e começou a pesquisar possíveis fatores que pudessem interferir nessa atividade elétrica corporal. Alguns cientistas baianos que conviveram com o renomado pesquisador comentaram a boca pequena que todo o trabalho de Kaplan sofreu uma mudança de paradigma após o seu contato com o eletrizante carnaval baiano. Kaplan, impressionado com a magnitude do evento ( e com uma baiana porreta que fez o cientista gemer sem sentir dor), endoidou e começou a pesquisar o CEHUT (Campo Elétrico Humano Total), termo definido por ele como o campo elétrico gerado por uma grande massa de indivíduos sintonizados em uma mesma freqüência de energia. Uma das conclusões de sua pesquisa com o CEHUT foi que em condições atmosféricas específicas a emissão do CEHUT pode produzir uma onda elétrica na atmosfera que ioniza as partículas de água do ar. Essa ionização, por sua vez, diminui a distância entre elas, aumentando o coeficiente de condensação e a quantidade de nuvens. Ë por isso que, quase sempre chove no carnaval.
No caso específico de sua pergunta, o fato de Ribeirão ser uma cidade muito quente e, ao mesmo tempo, com poucos eventos culturais ao ar livre que mereçam a nossa atenção, produz as condições ideais, postuladas por Kaplan em um segundo artigo seminal escrito para a Nature (1993) chamado Circunstancials and total human electric fields as a result of specific coletive human events. Essas condições podem ser resumidas da seguinte forma: O pré-conhecimento da possibilidade de um show interessante pela comunidade de humanos interessados em uma cidade carente de eventos culturais significativos feitos ao ar livre produz uma potencialização do CEHUT gerado normalmente nessas condições. Esse campo elétrico extremamente forte, quase que três vezes maior que o esperado em condições normais de cultura e pressão, agrega também, por sua vez, três vezes mais gotículas de água suspensas na atmosfera o que, fatalmente, gera CHUVA.

20 setembro 2006

Saudade, os povos que não tem a palavra, não sentem?

Lau perguntou:

Saudade, os povos que não tem a palavra, não sentem?

Todos os povos sentem saudades, porém os que não possuem a palavra acham que o que estão sentindo é apenas “uma falta de”.

18 setembro 2006

Por que o cravo brigou com a rosa?

Estou-com-medo perguntou:
Por que o cravo brigou com a rosa?

Em briga de marido e mulher não costumo meter minha colher but...

Na época do ocorrido, o papel da mulher-rosa na sociedade florística então vigente era bastante limitado. Quando digo limitado, refiro-me às participaçõe sociais solares e evidentes. À pobre rosa eram dadas tarefas ditas femininas como, por exemplo, ornar vasos em festas e comemorações famílias. Já o cravo, saia para ferver quase toda noite, voltava para casa de madrugada, bebia muita seiva etílica e ainda contava uns leros até para flor de toalha de plástico, para ver se comia. Rosa, incoformada que era com o papel submisso da flor-mulher na sociedade, quando podia, tentava ampliar sua capacidade de ação e reação no conjunto de valores vigentes. Dessa forma, costumava frequentar bares onde flores nao entravam desacompanhadas. Assim como também insistia em jogar golfe no clube masculino local. Nao preciso nem dizer que isso gerou inúmeros desconfortos em cravo que, apesar de tentar ser moderno e progressista, nao engolia essas modernidades da rosa. Preciso explicar mais? As brigas começaram assim, verbais e mansas mas, com o tempo e a insistência de rosa em suas convicções, tornaram-se mais enérgicas e físicas, culminando com o episódio ocorrido em baixo da sacada do autor da célebre cantiga, onde nossa querida flor saiu despetalada.

16 setembro 2006

Por que? Como? Quando?

Eduardo perguntou:
Por que, oh sábio, o céu não é verde e as plantas não são azuis? Como devo agir em caso de invasão extraterrestre visivelmente inimiga? Quando devo trocar o óleo da moto?

Prezado ser cheio de dúvidas, vou dar uma colher de sopa e responder suas questões de uma vez, porém, devo alertar a todos que não costumo fazer isso. Da próxima vez, faça sua pergunta e retorne ao final da fila. Como sinto que essas questões que atormentam seu ser possuem um elemento em comum que as liga, tornado-as quase que uma única coisa, vou respondê-las de baciada.
Primeiro, o céu não é verde porque ele JÁ é azul, isso é tão óbvio que chega a me irritar ter que responder. Sendo você, pelo jeito, um ser perguntante, vou economizar seus dedinhos tecladores, respondendo porque o céu é azul. Culpa do oxigênio, da composição de nossa atmosfera, que, quando os raios solares passam por ela, faz daquilo que está no alto de nossas cabeças, um anilzinho só. Segundo, as plantas precisam da luz do sol, aquela que deixa a atmosfera azul, para produzir glicose e alimentar suas células. Esse processo todo, conhecido como fotossíntese (produção pela luz) além de fornecer comidinha para as bonitinhas, também libera oxigênio para a atmosfera que, por sua vez, vai contribuir para céu azul de nosso planeta.
No caso de invasão por extraterrestres hostis, alguns procedimentos básicos podem ajudar a prolongar sua existência durante o conflito. Primeiro, tente se esconder já que assumimos de antemão que eles são hostis e nem tente se comunicar com eles porque, se um pc tem dificuldades de comunicação com um mac, imagine, então, as chances ínfimas que você terá de diálogo com esses déspotas intergaláticos. Depois, procure observar se eles usam algum tipo de capacete lacrado porque, muito provavelmente, composição esperta como a da nossa atmosfera (e que deixa o céu azulzinho) deve ser difícil de encontrar em qualquer outro lugar do cosmo. Por isso, os cachorros do espaço sideral, com certeza, terão dificuldade em respirar, se é que eles respiram, nosso arzinho cheio de oxigênio. Sim o oxigênio, aquele que faz o céu ser azul e é também liberado pelas plantas durante a fotossíntese que, por sua vez, usa a luz do sol e a clorofila, pigmento responsável pela cor verde das plantas. Resumindo, em caso de confronto inevitável, procure acertar os capacetes deles, seja com uma pedra, um rifle ou um canhão de raio laser.
Para concluir, (pensou que eu tinha esquecido?) o melhor momento para trocar o óleo da moto é exatamente em tempos de paz e não em tempos de invasões extraterrestres, de preferência uns quatro ou cinco quarteirões antes de fundir o motor, porque ainda dará tempo de achar um posto.

Alimentos orgânicos podem melhorar a velhice?

Bel Franchi peguntou:
Prezado guru Cleido, tenho pensado em me alimentar com produtos orgânicos. O que voce me aconselha? Será que com isso melhoro minha velhice?

Prezada irmã orgânica, pode ser que sim e pode ser que não. Para explicar meu ponto de vista, começarei falando sobre o riacho que todo dia você observa de sua janela que dá para a mata atlântica e onde ainda sopra uma brisa pura e árcade. Como pode todo dia ele ser o mesmo riacho, se as águas que hoje passam por ele não são as mesmas que ontem ali estavam a rodopiar? O que define aquele pequeno trecho de águas correntes como seu pequeno riacho se, a cada momento, ele é constituído por novas moléculas? E você? Se suas células epiteliais se renovam a cada semana por completo, que você será você, a semana que vem?
Esse pequeno prólogo é apenas para nos situar no terreno pantanoso em que pretendemos erguer sua casa (a velhice) alicerçada, por sua vez, com tijolos de massa orgânica. Pense em sua vida, nos quantos anos que seu corpo tem sido construído com cimento encharcado por inseticidas, adubos, hormônios animais e etc. Pense em cada célula cimentada com essa argamassa impura e mixada no wallita mix de nossa vida moderna. Quanto de você é, hoje em dia, inorgânico? Quanto de você é, hoje em dia, construído por essas substâncias aparentemente nocivas que os produtos orgânicos, com o tempo, substituirão? Estás preparada para uma nova vida livre do que faz mal?
Vou ainda mais além? Estás preparada para uma nova vida livre do mal?
Por isso recomendo cautela, porque não sabemos quanto do que é bom em nós emerge da lama consumida por nós nas últimas décadas, como a flor de lótus nasce do pântano podre que a cerca.
E o riacho? Ele continua lá, mesmo mudando suas águas. E você? Continua aí, mesmo tendo renovada toda suas células. Você sabe disso, o riacho sabe disso, então pode valer a pena arriscar.

Como se explica a paixão?

Tânia Alonso perguntou:

Ó Oráculo dos Oráculos! Como pode ser explicada a paixão? Não a de Cristo! Quero dizer... a dos homens mesmo... homens no sentido do ser humano - homens + mulheres + crianças + transgêneros... enfim. Como se explica?

Prezada amiga Tânia, ah, a paixão. Puro afã, zum de besouro, um imã. Branca é a tez da manhã! Pronto, está explicada a paixão. Tá bom, tá bom, tá bom, acho que você quer um pouco mais do que o Djá cantou, né? Sua pergunta, querida Persona dell’arte, é transdisciplinar e portanto pode ser respondida embasada (e passeando) por várias áreas do conhecimento humano. O que é a paixão? Perguntou o psicanalista. É você, mamãe! Respondeu Édipo. O que é a paixão? Perguntou o cientista. Eu não sei, mas sei onde fica! Respondeu o neuro-psico-farmacologista.
Mas, na verdade, existe uma resposta e eu, como oráculo honesto que sou, não me esquivarei dela com evasivas poéticas que se desmancham no ar como zuns de besouros. Não direi que a paixão não se explica, que apenas se sente, porque essa é a resposta dos incompetentes.
A paixão se explica na incompletude humana, na eterna busca da totalidade perdida quando caímos nesse mundo e rompemos nossos laços com o útero e, por conseguinte, com a grande mãe-tudo-universo. Largados no mundo, separados do Éden, somos apenas humanos pela metade a procurar quem nos complete, doloridos pela falta da compreensão e da tranqüilidade do Todo, da salina morna que havia nos banhado até então.

15 setembro 2006

Por que os kamikazes usavam capacetes?

David Araújo perguntou:
Por quê os kamikazes usavam capacetes?

Prezado amigo David, lamento informar-lhe que os kamikazes NÃO usavam capacetes.
Sei que tal resposta poderá provocar um tremendo choque em suas dúvidas nipo-históricas, mas temos que enfrentar a realidade, não é mesmo? Para ilustrar meu ponto de vista, mando o seguinte link: http://www.geocities.com/ctemplar270/kamikazes.jpg
Nele, você vai confirmar que digo a verdade e que o que tens acredito por anos, não passa de uma falácia. São lendas históricas que podem servir para desestabilizar nossos pensamentos e confundir nossa noção de certo, errado, oriente, ocidente, quente, frio e etc.
Talvez, o nobre neuro-imagimaker, tenha confundido a touquinha básica que eles usavam para ajudar a segurar os óculos com o famigerado capacete.

Antes que você me pergunte, os óculos serviam de proteção contra algum possível dano ocorrido pelas balas disparadas pela turma dos aliados nos vidros do avião. Esse dano, por sua vez, possibilitaria a entrada de ventos excessivos que fariam o pobre do kami cerrar ainda mais seus olhinhos e, com isso, errar o alvo. Desculpe mais uma vez mas, derrubar para a real, também é o papel de um oráculo honesto.

13 setembro 2006

Os ornitorrincos têm complexos existenciais?

Paulo Rocco perguntou:
O ornitorrinco, que é a prova viva de que Deus tem bom humor, não sofreria de complexos existenciais devido à sua aparência, digamos, diferente?

Prezado Paulo, não, não sofre porque vive entre os iguais e, portanto só é diferente para nós que estamos fora, somos observadores e vemos os ornitorrincos, nós mesmos, os patos e os outros animais em geral e comparamos tudo. Eles não comparam nada, são todos iguais e vivem felizes fazendo aquilo que mais sabem fazer: ornitorrincar, ou seja, serem ornitorrincos.
Com o perdão da palavra, a merda começa conosco, humanos que, através da linguagem, percebemos nós mesmos e os outros e começamos a comparar. Comparamos quem é mais alto, quem é mais baixo, quem é mais inteligente, quem é mais sexy. Temos tanta fúria comparativa que até extrapolamos nosso próprio âmbito humano e começamos a comparar conosco, coisas diferentes, de natureza e existência diferentes. Daí que dizemos que o pingüim é simpático e o ornitorrinco é esquisito. Mas não se iluda, o orni-macho faz o maior sucesso lá com as orni-nega dele, ninguém acha ninguém esquisito. Só nós achamos e, talvez, Deus.

12 setembro 2006

Por que se chamava Forte Apache?

Renata perguntou:
Se era um forte usado pelos brancos para se defenderem dos índios, por que se chamava Forte Apache?

Prezada Renata, posso garantir que essa foi a pergunta mais difícil que respondi nessa minha curta existência enquanto oráculo. Existem duas hipóteses básicas para explicar o nome Forte Apache e sua (aparente) contradição. Na primeira dela, o forte original ficava próximo a cadeia de montanhas Apalaches que permeia a américa do norte. Dessa forma, o Forte ApaLAche original fazia referência às montanhas que repousavam no horizonte semi-distante. Ao se transformar em um brinquedo de índio e mocinho da Gulliver, aliás, brinquedo que tenho trauma porque quem tinha era meu vizinho e, por isso, sempre que eu brincava tinha que ser os índios e, invariavelmente, morrer no final. Recapitulando, ao se transformar em brinquedo, os tradutores e inventores de nomes (que também trabalham em tradução de filmes, pelo jeito) retiraram o LA para uma maior identificação da meninada (hoje na faixa dos enta) com os variados filmes, gibis e etc. de mocinho e índios da época.

Porém, adultos informados, antenados e pós-modernos que somos, não podemos nos contentar com uma explicação, apesar de lógica e verdadeira, tão simplista. Acredito que essa mudança no nome foi proposital e fez parte de um bem armado plano da inteligência americana apoiada pelo regime totalitário que se instalava em nossa América latina. Batizando de Apache, um centro de resistência do homem branco e protestante ocidental frente ao mundo selvagem, produzimos uma identificação inconsciente do povo oprimido (nós) com os selvagens que atacam o forte americano. Você deve estar, nessa altura do campeonato, perguntando; “Sei, mas e daí?” Daí, cara Renata, que uma das formas mais sutis de abrandar o poder guerreiro de um povo é, justamente, confundi-lo com o branco opressor, encharcá-lo de processos culturais importados e torná-lo sem chão, sem raiz, sem futuro. Forte Apache, afinal quem somos nós nessa luta? Os mocinhos? Os índios? Estão gerados a confusão, o enfraquecimento e o caos.

Por onde andará o Major Tom?

Thomas perguntou:

Por onde andará o Major Tom? Ele até que respondeu umas vezes pro Ground Control, mas depois mais nada...

Dear Thom, existem controvérsias sobre o paradeiro de Major Tom, apesar de ter respondido ao controle de terra, suas respostas foram vagas e passíveis de múltiplas interpretações. Schilling diz que ele encontra-se feliz e apenas quer que sua esposa saiba que ele a ama. Já Bowie, em seus últimos comentários, insinua que ele voltou para a Terra e se afogou no lingerie, se é que você me entende. Prefiro acreditar, e tenho provas circunstanciais disso, que como ele mesmo disse depois de perder o contato com o ground control, ele está voltando para casa:

"Esta é minha casa, Estou chegando em casa... A Terra abaixo de nós, Vagueando, caindo, Flutuando sem peso... Chegando, chegando em casa... Em casa...”*

O grande problema passa a ser, então, nosso referencial. Se ele está voltando para casa e a Terra está logo abaixo, ele tanto pode estar voltando para ela, depois de um período no espaço, aprendendo e evoluindo, como em 2001. Como ele pode estar deixando a Terra para trás, para baixo e partindo rumo ao infinito (afinal ele pede ao ground control que diga a sua esposa que ele a ama). Porém, partir para as estrelas, também é voltar para nossa proto-casa-uterina-pré-big-bang. Já que nossos átomos são os mesmos que um dia deram origem ao universo e, portanto, somos feitos da poeira das estrelas. Resumindo, para mim, ele está lá, mais perto do ínicio, agora que estamos no fim.

(*tradução catada em http://schilling-peter.letras.terra.com.br/letras/300934/)

Por que fazer nada tendo tanto a fazer?

Tatiana perguntou:
Caro Oráculo, Por que um ser humano em uma fase crítica do doutorado fica horas passeando pelo orkut? quando, na verdade, deveria desenrolar o nó em que se meteu?

Prezada amiga enrolada, pelo simples fato que a menor distância entre dois pontos nem sempre é uma reta. Aliás, em casos extremos de ansiedade e prazo a cumprir, essa menor distância se transforma em uma grande espiral que acaba chegando ao outro ponto, mas pode demorar um pouco mais de tempo que nosso superego gostaria. Mantenha a calma e passeie à vontade pelo orkut e outros sites. Fazer bolo e arrumar a cozinha também tem efeito semelhante. Colocar coisas em ordem alfabética também é uma delícia. Não se preocupe, o nó a ser desatado, já está sendo desatado. Ou você pensa que todo seu ser se encontra só na internet? Parte dele, microscopicamente, já se ocupa em afrouxar as amarras que te prendes.

11 setembro 2006

Por que não tenho nenhuma pergunta?

André Nobreza perguntou:
Querido mago da perguntas. Depois de visitar sua comunidade "Pergunta que eu respondo", eis que me surge uma indagação que me deixa inquieto por completo.
"Por que eu não tenho nenhuma pergunta?"

Prezado mestre das línguas anglo-saxônicas, começarei essa resposta com a máxima esotérica que diz: “do tao surgiu o um, do um surgiu o dois, do dois surgiu o três que é todas as coisas”. Ou seja, a própria definição da existência da não-existência (o tao) já define alguma coisa, o um. Por sua vez, definir a unidade e o nada faz com que tenhamos a dualidade, o dois. Assim, o nada, a unidade e a dualidade (0, 1 e o 2) definem a trindade que, no esoterismo, é todas as coisas possíveis, pois representa as possibilidades infinitas que surgem dessa construção inicial a partir do tao.
Vejamos então o seu caso. A partir de uma não-pergunta, você remodela o nada e retira dele a unidade, ou seja, sua anti-pergunta. Ela, por sua vez, transforma-se em uma unidade, uma pergunta e, com isso, seus medos, sua timidez em enfrentar o oráculo e perguntar se dissipam e tudo se ilumina. Parabéns!

10 setembro 2006

Por que pegamos o recibo do supermercado?

Renato Vieira Andrade perguntou:

Por que a gente sempre pega o recibinho do super (mesmo no valor mais ínfimo) se três passos depois jogamos na primeira lixeira disponível?

Prezado artista, simplesmente por uma questão de educação. Quando a moça do caixa entrega para você o troco e o papel, seria extremamente deselegante você pegar só o dinheiro e deixar o ticket do caixa lá em cima para ela jogar fora. Se só esse motivo não bastar, antropologicamente falando, podemos dizer que você apenas está respondendo a uma sugestão de comportamento, ou seja, você, empiricamente, responde a uma ação (proposta pela moça do caixa) com outra ação. Ou seja, vocês coordenam ações e, em outras palavras, conversam. Lógico que você poderia virar para ela e sugerir que ela enfiasse o pequeno papel em algum orifício escondido do opulento corpo dela, mas daí, séculos de civilização iriam para o espaço em milisegundos! E não foi essa a educação que a mamãe te deu, não é mesmo?
Continue assim, isso é cidadania imprintada nos pequenos gestos cotidianos. Fora o fato que amassar o papel, ter que procurar um lixo e acertá-lo, queima calorias, estimula o sistema nervoso e afina as conexões do cerebelo.

09 setembro 2006

Qual o sentido da vida?

Marina O. perguntou:
Lembra de um filme do Monty Python que começa com os peixinhos no aquário, pra lá e pra cá, pra cá e pra lá? O nome do filme é "O Sentido da Vida" , e eu, caro Cleidoráculo, vos pergunto: Qual o sentido da vida?

Prezada Marina, lamento informar, mas a vida não tem sentido! No máximo tem uma direção e, mesmo assim, por culpa do Prigogine que ficou com aquelas frescuras termodinâmicas da irreversibilidade da flecha do tempo, da impossibilidade de reversão da direção das reações químicas, da eterna tendência à desordem e ao caos pelo aumento da entropia do sistema que o tempo provoca. Por conta de tudo isso, dessa direção da flecha do tempo, nascemos, crescemos e morremos e, no meio do caminho, nos divertimos um pouco, se conseguimos.
O problema do sentido da vida que tanto perturba os pensadores desde a Grécia antiga, na verdade, é apenas um efeito colateral, uma rebarba, da capacidade dos seres humanos de pensarem e terem auto-consciência. É a cachorra da auto-consciência que nota que nós existimos, que os outros existem e que as coisas e os outros seres vivos também existem por aí. Diante da tanta consciência de existência, começam a aparecer as perguntas (vide tópico sobre a origem das perguntas) e, embasbacado com o fato de tanta complexidade, começamos a achar que tudo isso deva ter algum sentido, que essa complexidade de processos auto-criativos que conhecemos como vida, tenha algum propósito. Mas não tem! Posso garantir que não tem. O único sentido da vida é o “sentir a vida”, deixar-se levar pelo fluxo de acontecimentos que ela é, ou seja, deixar-se fluir no viver. Lembrando do final do filme que você citou, é acordar, tomar café, levar as crianças na escola, passear, namorar, cortar o cabelo, pagar as contas, ler e etc.
O resto são questionamentos e dúvidas que surgem depois quando pensamos sobre, mas, convenhamos, refletir é bem diferente de ser.

06 setembro 2006

Como os cachorros se casam?

Nicolau perguntou para o seu pai:
Como os cachorros se casam se eles ficam presos em casas?

Muito bonita esta pergunta, meu filho. Nunca tinha pensado nessa condição dos cachorros modernos de classe média que ficam presos, como seus donos, em seus maiores ou menores caixotes confortáveis.
Realmente, eles ficam presos nas casas, geralmente sozinhos e muitas vezes funcionam como irmãos mais baratos, já que não precisamos pensar na faculdade nem no baile de 15 anos deles. Mas mesmo assim, muito deles ainda se casam quando chegam à idade de se casar. Seus donos os levam para passear, pelas ruas arborizadas da vizinhança onde eles podem conhecer e cheirar possíveis noivos/noivas. Eles se cheiram, balançam seus rabinhos (se ainda os têm) e até ficam felizes, cantando “me dê sua pata peluda vamos passear, sentir o cheiro da rua...” Quando são de raça (com pedigree), seus donos combinam com outros donos para que eles se encontrem e tenham filhotes, facilitando assim, o casamento entre eles.

05 setembro 2006

Quem Inventou a Pergunta?

Fernando Silveyra perguntou:
Prezado oráculo, gostaria de saber: Quem inventou a pergunta? E, ademais:
seria o mesmo indivíduo, associação ou tribo que, simultânea ou posteriormente,
tenha também inventado a resposta?
Prezado pergunteiro profissional, interessante questão que só possui equivalência (de sentido e porte) no âmbito da Biologia evolutiva com a pergunta: Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?
Bem, mas no nosso caso, acredito que a pergunta nasceu junto com a linguagem. Portanto, somente através da linguagem é possível perguntar. Mas não só a linguagem oral explícita, mas toda e qualquer forma de linguagem. Assim, um bebê que ainda não fala pode perguntar, porque, apesar de ainda não falar, ele já está imerso na linguagem, em um mundo construído por e pela linguagem! Mas afinal, o que é linguagem? Para o pensador Humberto Maturana, linguagem é a coordenação de coordenações de comportamentos consensuais (ou algo parecido com isso, sabe Deus!). Assim, nós humanos, vivemos juntos desde os tempos primordiais e construímos nosso mundo através de nosso viver juntos (através da linguagem) onde compartilhamos ações coordenadas (também através da linguagem). Aliás, é a linguagem que permitiu aos seres humanos, serem humanos. A linguagem é o humano. Com ela e através dela, criamos as coisas, os fatos, as palavras, o passado, o presente, o futuro e também as perguntas.
Com relação às respostas, elas, com certeza, surgiram antes das perguntas, só que como ninguém ainda havia perguntado nada, ninguém tinha, também, conhecimento da existência delas.

Como se faz um Brownie

Paula Faggioni perguntou:
Preciso de uma receita de brownie!!!

Prezada amiga Paula, delicie-se com esta maravilhosa (e fácil) receita de brownie. A Ana Maria Braga iria gemer, sem sentir dor, se seu palato tivesse a honra de tocar um bocado dessa iguaria. Existem outras receitas, algumas até melhores, mas essa é básica, fácil e muuuuuuuuuuito boa. Nem preciso dizer que uma bola de sorvete de creme pega bem, certo?
Lá vai:

100g de manteiga, resista, não use margarina.
1 xícara de chocolate em pó, eu disse chocolate em pó, NÃO nescau nem toddy nem outro achocolatado.
2 xícaras de açúcar
4 ovos
1 xícara de farinha de trigo, a Renata é a the best.
1 xícara de castanha do pará moída

Derreta a manteiga, acrescente o chocolate, farinha, ovos, castanhas, mexendo com uma colher de pau. Colocar em uma assadeira retangular pequena, untada. Asse até formar uma casquinha na parte de cima. O meio fica meio cru mesmo, afinal o brownie tem esta característica de bolo embatumado, porque não vai fermento e, portanto, não cresce. Não sei quanto tempo e nem em que temperatura se assa, mas a vida é assim mesmo, tente o forno médio e uns 30 minutos. Eu costumo ir no zóiometro mesmo

02 setembro 2006

Efeito Schurman

Adda perguntou:
Se o efeito schurman diminui o dia, na verdade em que em dia, mes e ano e estação nós estamos hoje?

Prezada amiga deslocalizada, interessante questão. Friederich August Schurman (pronuncia-se xúrmãm), famoso astrofísico austríaco que teorizou o famoso efeito schurman, disse que o efeito da expansão inicial do big bang, promoveu um aumento exponencial na energia das partículas subatômicas. Na verdade, isso é lógico e simples de se entender. Supondo que a massa original do grande neutron que deu origem ao nosso universo conhecido fosse X, tudo, resultante da explosão inicial, teria sido, enquanto massa, menos que X. Acontece que, como Schurman provou com seus intricados cálculos matemáticos, a totalidade de massa resultante da soma de tudo que é mássico (neologismo que significa "passível de possuir massa") nesse nosso mundão de Deus É MAIOR que a soma das partes das partículas de nosso universo. Schurman, num ímpeto de genialidade e insight cósmico, concluiu que esse "excesso de massa" de nosso universo só poderia ter sido produzido de duas maneiras: Na primeira dela, alguma inteligência superior e criadora de universos, também conhecido como Deus, teria criado esssa nova matéria com o forte propósito de complicar bastante a vida dos coitados dos que se metessem a tentar explicar a origem e o destino de todas as coisas. Na segunda delas, também conhecida como "causa Schurman" a própria expansão do universo formado na big bang inicial, geraria essa alteração de matéria devido ao movimento das partículas em uma velocidade cada vez mais proxima a da luz. De uma maneira mais detalhada, a pontapé inicial dado pela explosão do grande neutron, aceleraria tudo até um limite próximo à velocidade da luz (tudo isso, comprovado pelo desvio da luz emitida pelas estrelas distantes para o vermelho, observado nos telescópios espectrofotométricos).
Como vocês e o Einstein sabem muito bem, as coisas ficam muito loucas quando se aproximam da velocidade da luz. O tempo fica doidão, se comporta muito mal e só passa de ano porque, também em escala cósmica, existe uma espécie de progressão continuada em que nada é reprovado de ano.
Como o tempo fica loucão, proximo da velô da luz, trilhonésimos de bilionésimos de segundos vem sido sendo descontados desde o big bang (e esse é o famoso efeito Schurman). Donde ocorre que, em 1959, esse tempo descontado deu justamente um dia de duração. Se estiver dificil de acompanhar o raciocínio, tente visualizar sua conta de banco sendo descontada, ano após ano, da taxa do cpmf, pensa em quanto você já perdeu para os cofres públicos! Pois é, o universo também cobra seu imposto de nossos míseros e cotidianos anos de existência.
Fazendo então as contas, se em 1959, perdemos nosso primeiro dia e de 1959 até o big bang passsou muito tempo, podemos cosiderar que perdemos apenas um dia inteiro desde então (da origem do universo) mais uma titica ínfima de tempo (considerando de 59 para cá) que nem vale a pena levar em consideração nas nossas contas.
Por isso, prezada amiga desnorteada, na verdade, você hoje, só está um dia atrasada em relação ao tempo universal e verdadeiro o que, convenhamos, não faz muita diferença em termos de pagar contas e se arrepender de seus pecados...


Plutão na 2ª divisão

Eduardo Martins perguntou:
Agora que Plutão foi rebaixado para a 2ª divisão do campeonato interplanetário, como ficam os sargitárianos que eram regidos pela sua influência cosmo-zodiacal? A cigana me enganou?

Prezado sargitariano desiludido, não, não, a cigana não te enganou. Primeiro porque, eu acho, que o pluplu não entrava na calculação astrológica, ou entrava? De qualquer maneira, vc nao foi enganado simplesmente porque até pouco tempo atrás, plutão era um planeta, todo mundo acreditava nisso. E basta todo mundo acreditar para que um hipótese se transforme em verdade. Vide, por exemplo, a igreja catolica. Caro Eduardo, não se sinta enganado, viver em um mundo em equilibrio dinâmico e pós moderno, é assim mesmo, uma hora aqui, outra ali... uma verdade aqui, outra verdade ali... é o fim das certezas! Plutão cumpriu (e cumpre) seu papel com dignidade de um pequeno astro longínquo e gelado que, na medida do possível, interferiu no grande e delicado jogo do universo e, por conseguinte, também em nossas míseras vidas!!!!!!

21 agosto 2006

Quem foi Santo Onofre da Patinha Peluda?

Boa pergunta. Santo Onofre da Patinha Peluda foi um humilde camponês da itália renascentista chamado Onofre di Baggio que nasceu com essa estranha deformidade nas mãos (que se assemelhavam a patas de coelho) e que, com a chegada da puberdade, ainda ficaram recobertas de pelos. Alvo de inúmeras gozações da molecada, Onofre foi ficando cada vez mais introspectivo e, sua vida, limitava-se a debulhar o trigo e recolher cada bago do trigo, além de tocar, de uma forma percurssiva semelhante ao Jorge Ben e ao Arto Lindsay, seu alaúde (já que o formato de patinha de coelho de suas mãos impediam-no de lidar com qualquer coisa parecida com dedilhar e formar acordes).